Um brinde (com café) ao Dia Nacional do Café, comemorado hoje, 24 de maio. Essa bebida é preferência nacional e a segunda mais consumida no mundo – só perde para a água. Graças à ciência agronômica que viabiliza seus cultivos ao longo da história, é possível manter disponível esse produto que é consumido em 98% dos lares brasileiros, segundo levantamento em 2019. São tantos causos em torno dessa cultura no Brasil, que dá para tomar bons goles, enquanto rola a prosa. Referência em estudos com cafeeiros, o Instituto Agronômico (IAC), de Campinas, da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, foi fundado por D. Pedro II, em 1887, justamente para estudar os problemas que atingiam a espécie naquela época. De lá para cá, o IAC nunca mais interrompeu seus estudos e desenvolveu 67 cultivares de café. O Instituto é responsável também por estudos com café naturalmente sem cafeína, colheita, produtividade e resistência a pragas e doenças, além de qualidade da bebida, que é o que conquista fãs por esse mundo afora.
A data comemorativa foi oficializada pela Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC), em 2005. A escolha do dia coincide com o período de início da colheita na maior parte das regiões cafeeiras do Brasil, que é o maior produtor e o maior exportador de café verde no mundo e também o segundo maior consumidor de café do globo.
São do IAC as cultivares mais plantadas nos cafezais nacionais e paulistas: chamadas Mundo Novo, Catuaí Vermelho e Catuaí Amarelo, juntas elas representam cerca de 80% do café arábica produzido no Brasil. O tipo arábica é o usado para produzir a bebida nas casas dos brasileiros. A produção nacional responde por 2/3 do volume mundial desse tipo de café. Quanto ao porcentual de cafeína, o arábica tem cerca de 1,1% e o robusta, duas vezes mais.
O país também produz 1/3 do tipo robusta ou conilon, utilizado na produção do café solúvel e em misturas de arábica. “A produtividade média estimada para a safra atual é de aproximadamente 29 sacas de café beneficiado, por hectare, para o café arábica e 34 sacas de café beneficiado, por hectare, para o café robusta”, diz o pesquisador do IAC, Oliveiro Guerreiro Filho, considerando dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB).
O IAC tem o mais importante banco de germoplasma de café do Brasil, onde são mantidas 15 espécies das cerca de 126 existentes no mundo. A coleção de plantas vivas é essencial para a realização de estudos – sem elas não se faz pesquisa e sua manutenção requer muito trabalho e investimento. “Existem no mundo cerca de 126 espécies de café; 57 delas endêmicas em Madagascar; a grande maioria das demais encontra-se distribuída pelo continente africano e umas poucas, na Ásia”, diz Guerreiro.
Considerando apenas o café robusta, o líder é o Vietnã. Na safra passada, a produção vietnamita foi de 29 milhões de sacas, o que representa 41% da produção mundial desta espécie. “O Brasil produziu 14 milhões de sacas de conilon/robusta, ou seja 21% da produção mundial desta espécie, metade da safra do Vietnã”, explica o pesquisador do IAC, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA).
No Estado de São Paulo, a cultura foi responsável pelo desenvolvimento de vários setores, por exemplo, as ferrovias, destinadas ao escoamento da produção, lembra Sérgio Parreiras Pereira, pesquisador do IAC. “Nosso estado reúne o maior volume de café industrializado do Brasil e o maior mercado brasileiro de cafés especiais, sendo que está no IAC o programa de pesquisa de cafés especiais”, afirma Pereira.
E se não bastassem todos esses destaques do setor, o que dizer do cheiro do café? Além de gostoso, só ele basta para despertar o cérebro, conforme pesquisa publicada no Journal of Environmental Psychology. De acordo com Guerreiro, o aroma da bebida é resultado da expressão de muitas substâncias ou compostos já presentes nos grãos ou que são formados na elaboração da bebida. “ O preparo do café na pós-colheita é fundamental para a preservação da qualidade que, a princípio, todas as cultivares têm potencial para proporcionar”, diz.
Quem já viu um terreiro de café, onde os grãos ficam espalhados no chão, talvez não imagina que essa etapa define a qualidade da bebida. “As camadas altas de frutos maduros no terreiro levam muito tempo para secar e favorecem fermentações indesejadas, que podem conferir aromas desagradáveis à bebida. Assim, o preparo de um bom café, começa com um produto de boa qualidade”, afirma.
A intensidade da torra e a granulometria da moagem também interferem na qualidade do café. Ou seja, se torrar mais ou menos e se o café for moído em partículas menores ou maiores, isso também vai refletir no sabor e no aroma. “Grãos de boa qualidade podem e devem ser submetidos à torra mais leve e à moagem mais grossas; a extração é menos intensa e, na xícara, o café é mais claro, ralo, quase um chá”, diz.
Normalmente, cafés de qualidade inferior são submetidos à torra intensa para camuflar defeitos. E daí para um café ruim é um passo. Outras falhas podem ocorrer ao fazer a bebida. “Há inúmeros métodos de preparo da infusão. O mais comum, é o percolado, aquele em que se acrescenta água à 90°C ao café torrado e moído; o uso de água em ebulição, à 100°C é um dos erros; adicionar açúcar à água ou, depois, ao café é outro erro. Entretanto, isso é cultural”, relata Guerreiro.
E o consumo muda de acordo com o país e a cultura. Os americanos consomem café de excelente qualidade, segundo o pesquisador. “Eles adotam torra leve e maior granulometria de moagem; a extração de solúveis com água quente dá origem a uma bebida clara, aromática e de ótimo sabor”, avalia. O consumo vem crescendo muito na China, país que se tornou, inclusive, cafeicultor. A Índia é um tradicional produtor e também vem experimentando pequeno aumento no consumo, mas sempre se destacou pela exportação do produto.
Uma curiosidade em relação à cor dos frutos do café arábica e do robusta: ambos têm frutos vermelhos e amarelos. “No entanto, se considerarmos somente as cultivares comerciais, isso acontece apenas com o arábica”, esclarece.
Outras espécies apresentam cores variadas: C. stenophyla e C. ebracteotala têm frutos quase pretos. A C. racemosa tem frutos de cor violeta; C. kapakata e C. congensis têm frutos de cor laranja; C. milotti tem frutos amarelos e as demais espécies têm frutos vermelhos. Essas são curiosidades apenas, porque o brasileiro só se refere à cor da bebida para identificar se prefere puro ou não. “Um café preto, por favor!”