Segunda bebida mais consumida no mundo, atrás apenas da água, o café tem uma importância histórica para o Brasil. Desde a década de 1830, é um dos principais produtos da economia brasileira, colocando o Brasil no posto de maior exportador e produtor de café do mundo. Mas, apesar do consumo ter aumentado progressivamente, ao longo dessa trajetória as exigências dos consumidores globais têm mudado.
As pessoas estão em busca de produtos de qualidade, que não só preservem sua saúde como o meio ambiente. E para atender a estas exigências com eficiência, toda a cadeia, desde reguladores a agricultores, está se movimentando para a criação de métodos de produção de alimentos que sejam mais sustentáveis. Uma das alternativas, que tem apresentado excelentes resultados, é o manejo biológico com a utilização de bioinsumos para manter a plantação segura, sustentável e rentável.
Mercado biológico – E a movimentação do mercado está só começando. De acordo com pesquisas recentes divulgadas pelo Research and Markets, o mercado de insumos biológicos deve valer US$ 18,5 bilhões até 2026. Se confirmada a projeção, o setor teria uma disparada de 74% em apenas quatros anos na comparação com os US$ 10,6 bilhões de valores atuais. “É um mercado que só tende a crescer e não tem mais volta. Os agricultores, que não se conscientizarem, perderão mercado e numa velocidade muito rápida. Não é uma exigência apenas do mercado nacional, mas mundial. No entanto, que nos próximos dias 5 e 6 de outubro, organizaremos o III Simpósio Brasileiro de Manejo Biológico da Cultura do Café”, em Franca (SP)”, ressalta o diretor-executivo da AG Consultoria e Pesquisa Agronômica, Alessandro Guieiro.
Saúde e Sustentabilidade – A escolha do que a população mundial tem colocado em seu prato e em seu copo, cada vez mais, leva em consideração o equilíbrio entre saúde e meio ambiente. Nesse cenário, é cada vez mais presente a opção por produtos orgânicos e que sejam economicamente sustentáveis. Por isso, o manejo biológico da cultura do café torna-se uma alternativa viável, como um caminho que se abre para aliar saúde e sustentabilidade.
Essas mudanças são necessárias não apenas para o meio ambiente, mas também para a saúde da população e segurança alimentar. Estudos atuais apontam um contraponto entre produção de alimentos e segurança alimentar. Dados da ONU apontam que a fome atinge 9,8% da população global, ou seja, 2,3 bilhões de pessoas pelo mundo estão com insegurança alimentar moderada ou grave. Ao mesmo tempo, o pesquisador Sam Myers, diretor da Planetary Health Alliance, na Harvard Chan School, descobriu que quando culturas alimentares, como trigo, milho, arroz e soja são expostos ao CO2, em níveis previstos para 2050, as plantas perdem até 10% do seu zinco, 5% do seu ferro e 8% do seu teor de proteína.
Importante ressaltar que são nutrientes essenciais para a saúde das pessoas, já que sua deficiência pode causar, dentre outras, mortalidade materna em torno do parto até problema cerebral das crianças. Além disso, o zinco auxilia no sistema imunológico e o ferro para formar um bloco de construção fundamental da hemoglobina.
“Ou seja, se continuarmos não praticando uma agricultura sustentável em todas as culturas, cada vez mais a população precisará se alimentar em maior quantidade para adquirir os nutrientes necessários para seu organismo funcionar de forma saudável. E isso pode provocar problemas de saúde como a obesidade”, explica Guieiro. E completa: “Não será o uso de 5 bilhões de quilos de pesticidas anualmente o responsável por acabar com a fome no mundo. Ações inteligentes com embasamentos científicos estão desmistificando a dependência química na produção de alimentos”.
Mas essa mudança de paradigma não se refere à abolição total, mas ao uso racional de agroquímicos e a abertura em relação ao novo, como os produtos biológicos, que já é um passo que vem sendo galgado pelo produtor brasileiro.
“Aos poucos, o produtor está deixando as propriedades e indo em busca de informação. Estamos saindo de uma agricultura de produtos para uma agricultura conservativa, que preserva o ecossistema para não retornar aos problemas anteriores e garantir uma melhoria contínua”, destaca Alessandro.
“O manejo biológico proporciona um leque de benefícios, desde a qualidade do produto final, conservação do meio ambiente, aumento do valor agregado e a oportunidade de atender a uma demanda mundial por qualidade dos alimentos”, garante o agrônomo.
Importante destacar que a valorização do manejo sustentável e que respeite o meio ambiente é uma tendência que se dissemina pelo mundo. Vários países já exigem informações sobre a origem e todo processo produtivo, desde a semeadura até colheita e pós-colheita, visando tanto à sustentabilidade como à qualidade do produto. Diante desse cenário, é cada vez maior a busca por café orgânico (sem uso de agrotóxicos) e biodinâmico (cultivado em ambiente sustentável).
“O mundo está controlando com rigor os níveis de agroquímicos nos alimentos. Na Europa, por exemplo, a tolerância na análise de resíduos no produto é muito baixa. Enquanto no Brasil a tolerância é de 1 grama de glifosato por quilo de café, na Europa é de apenas 0,1 grama, ou seja, tolerância na Europa é dez vezes menos do que no Brasil. Se não atender a essa exigência, o produto é barrado e retorna ao país de origem”, explica o agrônomo. A molécula de glifosato é a mais utilizada no mundo por dar origem a inúmeros produtos comerciais, que se classificam como herbicidas não seletivos. De acordo com alguns estudos científicos, pode sair da planta alvo para a planta não-lavo. “Mesmo sendo aplicado nas plantas que devem ser controladas, o glifosato pode ser absorvido pela cultura de interesse econômico”, esclarece Alessandro.