A recente mudança nos créditos de ICMS promovida pelo Governo Federal têm sido ponto de atenção para o agronegócio. De um lado, em conformidade com a manifestação da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional no Parecer SEI 14483/2021/ME, a Instrução Normativa IN 2.121/2022 confirma o direito à manutenção do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na base de crédito das contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).
De outro, a MP 1.159/2023 foi editada para alterar as leis de regência de tais contribuições, com o objetivo de, além de estabelecer de forma expressa que o ICMS incidente na operação de venda de mercadorias não integra a base de cálculo da contribuição ao PIS e da Cofins, em consonância com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quando do julgamento do Recurso Extraordinário 574.406 (Tema 69), excluir da base de cálculo dos créditos o valor do ICMS incidente na aquisição de mercadorias, com entrada em vigor prevista para 1º de maio de 2023.
O agronegócio será bastante afetado, pois o setor tem a característica de acumulador de PIS/Cofins. Esta mudança irá impactar na gestão de créditos, principalmente pela redução na arrecadação com potencial de compensação. Agora haverá menos dinheiro no caixa de empresas e cooperativas do setor.
O agronegócio consegue dar vazão a esses créditos, diferentemente de outros segmentos da economia. Com essa medida, cairá o potencial de geração de créditos. Essa operação reduz em 9,25% o potencial de geração de créditos sobre os insumos. Isso traz uma insegurança jurídica para o contribuinte, que termina o ano dentro de uma configuração, confirmada pela Receita Federal, e já começa o outro ano com esse novo viés arrecadatório. Todos os segmentos sentirão essa alteração, mas o agronegócio sentirá uma redução significativa nos créditos acumulados.
Em meio a esta contradição, o contribuinte mais uma vez é afetado pelo viés arrecadatório do fisco. Ora, estamos diante de um tema de extrema relevância do ponto de vista financeiro, cuja supressão ao direito de manutenção dos créditos sobre a parcela do ICMS incidente nas aquisições de mercadorias traz um impacto importante para o fluxo de caixa dos contribuintes, especialmente no momento atual, em que vários estados, como forma de suprir as contas públicas, aumentaram as alíquotas de ICMS. Ademais, uma norma publicada no ano em curso, ainda que tenha sido respeitado o princípio da anterioridade nonagesimal, impacta diretamente as previsões orçamentárias dos contribuintes, cujas diretrizes foram compostas com base nos critérios vigentes em 2022, demandando eventuais revisões nos planos de investimentos.
No âmbito do agronegócio, setor historicamente acumulador de créditos de PIS/Cofins, a mudança irá impactar na gestão de créditos, especialmente porque após o ingresso dos contribuintes no e-Social, foi autorizada a compensação com os débitos previdenciários (contribuição patronal, devida a terceiros e FUNRURAL). Agora, as empresas em geral e cooperativas terão menos créditos disponíveis para compensação, ampliando a necessidade de geração de caixa.
Adicionalmente, tal alteração pode tornar o processo de apuração das contribuições para o Pis e a Cofins ainda mais custoso para os contribuintes, pois é necessário conhecer perante o fornecedor todo o tratamento tributário do ICMS junto ao Estado de origem da mercadoria, especialmente em operações que envolvam, por exemplo, o regime de substituição tributária de ICMS e a concessão de benefícios fiscais por meio de regimes especiais.
Cabe aos contribuintes buscar meios para equalizar o desequilíbrio que poderá advir com a entrada em vigor da MP 1.159/2023, revisitando o fluxo operacional de modo a garantir que todas as hipóteses de aproveitamento de créditos estão refletidas em suas apurações, seja pelas oportunidades trazidas com a consolidação do entendimento da RFB através da IN 2.121/2022, pelas recentes decisões do CARF, harmonizadas com o conceito de insumos firmado pelo STJ através do Recurso Especial 1.221.170/PR, bem como pelo posicionamento emanado pela RFB em Soluções de Consulta e Parecer Normativo Cosit 5/2018.
Mara Gauna é consultora especializada em tributos e head regional do Martinelli Advogados no Paraná