sexta-feira, 30 de maio de 2025

Inovação, Mercado mundial
Edição gênica impulsiona debate sobre nova lei de proteção de cultivares no Brasil
27/05/2025
Especialistas defendem a modernização do marco regulatório
Por: Vera Barão
embrapa soja conexao agro
Workshop Embrapa Soja
Divulgação

Os avanços científicos e as novas demandas do setor produtivo reforçam a necessidade de atualizar a legislação brasileira sobre cultivares e biotecnologia. Esse foi o foco do workshop Embrapa Soja 50 anos: histórico e perspectivas, realizado nesta segunda-feira (26), na sede da instituição em Londrina (PR).

Uma das prioridades da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), a revisão das normas que envolvem o licenciamento de cultivares está em discussão no Congresso Nacional e deverá começar a tramitar nas comissões da Câmara e do Senado nos próximos meses.

“O papel da Aprosoja é trabalhar todas as regulamentações que impactam o agricultor, desde questões ambientais até o uso de biotecnologias e genética. Estamos acompanhando de perto a construção dessa nova lei”, afirmou o presidente da entidade, Maurício Buffon, lembrando que a cadeia produtiva da soja é a maior em atividade no Brasil, com cerca de 2,2 milhões de pessoas trabalhando diretamente no setor.

Segundo Buffon, a proposta é criar uma legislação equilibrada, que contemple todos os elos da cadeia produtiva, garantindo remuneração justa para quem investe em pesquisa, sem comprometer os direitos dos produtores de produzir e multiplicar sementes. “Todos devem ser valorizados para que ninguém fique descoberto nesta nova regulamentação”. ressaltou.

Para o dirigente, o modelo atual é insuficiente e contribui para a concentração de mercado, especialmente devido ao domínio das grandes empresas detentoras de biotecnologias. “A própria Embrapa, referência em pesquisa agropecuária, hoje tem participação reduzida nesse mercado. Isso ocorre, em parte, pela falta de mecanismos eficazes de remuneração aos obtentores. Defendemos que toda a cadeia seja recompensada de forma justa, mas que o produtor também tenha seus direitos assegurados”, completou.

Durante o evento, Carlos Ernesto Augustin, assessor especial do Ministério da Agricultura e Pecuária, também defendeu a modernização do marco regulatório, especialmente diante das transformações trazidas pela edição gênica. “A biotecnologia avançou, e a regulação precisa acompanhar esse movimento. A transgenia exige um processo de registro complexo e custoso, que só grandes empresas conseguem cumprir. Já a edição gênica oferece um caminho mais simples e acessível para o melhoramento genético”, explicou.

No entanto, Augustin chamou atenção para o “vácuo jurídico” em torno da propriedade intelectual nesse novo cenário. “O Brasil não permite o patenteamento de seres vivos. No caso dos transgênicos, o processo pode ser patenteado, o que garante proteção. Mas, com a edição gênica, ainda não está claro como será feita essa proteção, o que cria insegurança para os desenvolvedores de tecnologia”, observou.

O chefe-geral da Embrapa Soja, Alexandre Nepomuceno, ressaltou que países como os Estados Unidos, por exemplo, já adotaram regulamentações mais objetivas para garantir a proteção das inovações. O cenário é distinto em países como a Argentina, que não reconhece a propriedade intelectual sobre sementes. O Brasil, por sua vez, reconhece esse direito, mas também assegura ao produtor a possibilidade de reservar sementes, o que amplia o debate.

“A grande questão é como construir uma lei que incentive a inovação, recompense quem pesquisa por décadas e, ao mesmo tempo, não onere excessivamente os agricultores”, ponderou Nepomuceno. “Sem uma forma de retorno, não há estímulo à inovação. A maior parte dos produtores entende isso, mas quer garantias de que o modelo não será abusivo.”

Segundo Nepomuceno, a expectativa é que, com a regulamentação da edição gênica e uma nova Lei de Cultivares, o Brasil avance em segurança jurídica e crie um ambiente mais propício ao desenvolvimento de soluções inovadoras. “O debate também ressalta a importância de fortalecer a pesquisa pública, como a realizada pela Embrapa, e assegurar que seus resultados continuem beneficiando toda a cadeia produtiva”.

O pesquisador observa que, diferente da era dos transgênicos, quando o mercado ficou concentrado nas mãos de poucas empresas devido ao alto custo e à complexidade regulatória, a edição gênica está abrindo espaço para mais players. “Estamos vendo mais instituições envolvidas, mais culturas sendo beneficiadas e uma diversidade maior de características desenvolvidas. Na era dos transgênicos, predominavam plantas resistentes a herbicidas e insetos. Agora, temos tomates com maturação programada, melhorias em hortaliças como alface e avanços muito além das commodities”, observa.

Com mais concorrência e participação de diferentes atores, a tendência é de redução de custos e maior disponibilidade de soluções tecnológicas no campo. “O aumento da competitividade tende a beneficiar toda a cadeia. O importante é garantir um ambiente regulatório equilibrado, que permita inovação com responsabilidade”, reforça.

Outra tecnologia emergente que está revolucionando o setor é o RNA de interferência (RNAi), que permite silenciar genes específicos de pragas, doenças e plantas daninhas. “Quem descobriu essa técnica ganhou o Prêmio Nobel. É uma inovação com enorme potencial, e os primeiros produtos já estão sendo autorizados no mercado”, afirma o pesquisador.

Um exemplo é o produto Calantha, desenvolvido pela empresa GreenLight Biosciences e aprovado pela EPA (agência ambiental dos EUA) em fevereiro do ano passado. Ele atua desligando um gene de um besouro que afeta a produção de batatas, reduzindo drasticamente o uso de inseticidas. “É uma amostra do que vem por aí. E o Brasil, que já lidera o mercado de bioinsumos, tem dobrado seus investimentos ano a ano nessas novas tecnologias.”

O avanço da edição gênica e do RNAi marca uma nova era na agricultura. Mas para que essas inovações cumpram seu papel de transformar a produção com mais sustentabilidade e eficiência, será fundamental contar com um arcabouço legal moderno e equilibrado — que reconheça o esforço de quem desenvolve as tecnologias, respeite os direitos dos produtores e estimule a competição saudável.

 

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